O despertador toca. Todo o dia toca. Todos os dias ela acorda, um acordar preguiçoso de quem se pergunta o porquê. Uma dessas perguntas sem respostas, que servem apenas pra saber que naquele momento ela não representa seu íntimo.
E todos os dias seguem como música, como novela com trilha sonora, cada momento tem seu tom, cada desgaste tem seu lamento, cada sorriso, um hino. E claro que engasga em palavras não ditas, em lições não dadas, alforrias não proclamadas e inteligências reprimidas. O mundo não era um lugar de sinceridades, e ela sabia. No mundo, a música se mantém na mente, como um mantra que não te deixa enlouquecer. Porque o mundo é silêncio.
Mas as sextas-feiras, não. Às sextas-feiras seguia para o bar local de poucas luzes e muitos sorrisos. Lá todos os silêncios reprimidos eram temas de amor. Lá seu sorriso era limpo e honesto, seu sexo não era leviano, sua sinceridade era acatada e sua amada lhe caía aos ombros, serena e calma, como uma lua no céu. Porque o mundo pode ser silencioso, mas refugia esconderijos de barulhos, desses que te salvam a alma até mesmo de si. E num desses mocós de felicidade estava a dela, que naqueles momentos a vivia com certa satisfação, um orgulho de viver digna e no proibido, escondida no âmbar de uma esquina qualquer.
Anônima de si, todos os dias segue. Um eu que vive e não volta pra casa, fica lá. Quem segue é só a sobrevivente, a que resiste e não morre. A que cala, a que esquarteja, a mão cega que executa antes que o coração perdoe - outra música dos dias vazios. Mas não esquece de si. Todas as sextas vai encontrar-se no bar de luz âmbar e sombras acolhedoras. Lá sua serenata é alta e sua música externada. Lá a palavra é dita, toda a verdade é suportada. Lá o mundo é de verdade. Depois volta pro mundo que não existe, não sabe não voltar. Mas não se esquece de si.
Canção pra não voltar
A banda mais bonita da cidade